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Deficientes… esse Corpo Especial… na Água

O “culto ao corpo” na atual sociedade é um lema na formação de nossos Profissionais de Educação Física. Apesar de muitas campanhas médicas e da mídia em relação à qualidade de vida, ainda persiste os padrões estéticos quando falamos de pessoas comprometidas com alguma deficiência física, sensorial e/ou intelectual. São tantos que precisam de ajuda e tão poucos dispostos a ajudar.

Sabendo-se que o deficiente é aquele que não consegue disfarçar, devemos tomar a postura, além de Profissionais da Educação Física, de terapeutas, “cirurgiões plásticos” da emoção e da ação.

Há mais de 38 anos temos tido em nosso trabalho junto à psicomotricidade, o objetivo fundamental de promover o bem-estar, a restauração da autoconfiança, muitas vezes perdida, e o prazer da realização. Verificamos que os benefícios surgem rapidamente ou a longo prazo, dependendo do nível e da intensidade do comprometimento.

Enquanto profissional devemos tentar restituir-lhes a autonomia necessária, desde que soubermos do patamar que essa pessoa poderá atingir na execução dos exercícios. O importante é que ela possa sentir-se menos diferenciada possível em relação ao grupo e às atividades da vida diária.

Uma análise retrospectiva da história da educação especial no Brasil evidencia que sua trajetória acompanha a evolução da conquista dos direitos humanos. Houve época em que pessoas com deficiências eram sacrificadas porque nada de útil representavam para a sociedade.

Durante séculos, os deficientes foram considerados seres distintos e à margem dos grupos sociais. A medida em que o direito do homem à igualdade e à cidadania tornaram-se motivo de preocupação dos pensadores, a história da educação especial começou a mudar.

A histórica rejeição cedeu lugar à compaixão e às atitudes de proteção e filantropia, até hoje perduram e muitas vezes prevalecem, apesar de todos os esforços que se tem realizado para que esta postura seja substituída pelo reconhecimento da igualdade de direitos a todo cidadão, sem discriminações.

Milenarmente é sabido das propriedades terapêuticas da água e das diferentes formas de utilizá-la com os deficientes. Os mais renomados profissionais da área da saúde se curvam aos seus benefícios, mas sempre se deparam com algumas dificuldades na sua utilização. A água é um elemento capaz de diminuir as diferenças entre os indivíduos e, em alguns casos, até torná-los iguais, já que nela a distinção deficiente/não deficiente fica menos nítida. Para um tratamento em que o lado emocional do paciente é um fator decisivo, a água novamente ganha importância pois proporciona prazer e bem estar.

1. Dificuldades:

Por parte da pessoa com deficiência: escassez de recursos financeiros; desigualdade de oportunidades oferecidas nas regiões onde habita, o desinteresse e resistência na maioria das entidades para aceitá-lo como alunos-pacientes. Por parte das entidades: acessibilidade e estrutura física das piscinas inadequada para a elaboração de programas de trabalho especial; despreparo teórico e prático dos profissionais para esse tipo de atendimento; carência de técnicas para a orientação, acompanhamento e avaliação de programas a serem desenvolvidos; insuficiência de propostas inovadoras, como alternativas educacionais e/ ou terapêuticas; inadequação e carência de materiais e equipamentos para um atendimento especializado e falta de programas adequados para a orientação da família do deficiente.

2. Público alvo:

Denominado de pessoa com necessidades especiais, aquela que por apresentar necessidades próprias e diferentes dos demais, no domínio das aprendizagens correspondentes a sua idade, requer recursos pedagógicos e metodologias específicas.  São pessoas com deficiências (intelectual, física, sensorial, múltipla), condutas típicas, como também com altas habilidades (superdotados)…

 A pessoa com deficiência é a que apresenta, em comparação com a maioria das pessoas, significativas diferenças físicas, sensoriais ou intelectuais, decorrentes de fatores inatos ou adquiridos, de caráter permanente, que acarretam dificuldades em sua interação com o meio físico e social.

A pessoa com necessidades especiais é aquela que apresenta, em caráter permanente ou temporário, algum tipo de deficiência física, sensorial, cognitiva, múltipla, condutas típicas ou altas habilidades, necessitando, por isso, de recursos especializados para desenvolver mais plenamente o seu potencial e/ou superar ou minimizar suas dificuldades.

No entanto a deficiência física é aparente e não temos como disfarçar… ela está lá, para todos verem e constarem. Daí o preconceito ser imediato e as reações as mais diversas possíveis.

3. Intervenções:

Qualquer programa de trabalho junto a essas pessoas deve se basear num processo que vise promover o seu desenvolvimento e que abranja diferentes níveis e graus de comprometimento. Deve fundamentar-se em referências teórico-práticas compatíveis com as necessidades específicas de cada aluno/paciente.

O processo deve ser integral, fluindo desde a estimulação essencial até a aprendizagem de técnicas, tendo como finalidade formar cidadãos conscientes e participativos, independente de suas deficiências.

Para aqueles que ainda a desconhecem, a Psicomotricidade é uma ciência reconhecida pela Organização Mundial da Saúde e com profissão regulamentada no Brasil. Ela poderia ser definida como: a realização de um pensamento, através de um ato motor coeso, econômico e harmonioso, exigindo para isso uma atividade equilibrada.

Sendo uma ciência do equilíbrio humano, podemos utilizá-la em vários processos, para prevenir e/ou reabilitar problemas originados da falta de harmonia entre o corpo/mente/ prazer.

4. Objetivos:

Normalizar, entendendo-se aqui não o de normalização de tais pessoas, mas sim do contexto em que se desenvolvem, ou seja, oferecer aos deficientes, modos e condições de vida diária o mais semelhante possível às formas e condições de vida do resto da sociedade.

Reabilitar, promovendo-se um conjunto de medidas de natureza médica, social educativa e profissional, destinadas a preparar ou reintegrar o indivíduo, com o objetivo de fazê-lo alcançar o maior nível possível de sua capacidade ou potencialidade.

Integrar, através de um processo dinâmico de participação das pessoas num contexto relacional, legitimando sua interação nos grupos sociais. A integração implica em reciprocidade.

5. Profissionais:

 Os profissionais são todos aqueles que conhecem e sabem lidar com o corpo, que souberem a teoria e a prática das propriedades físico-químicas da água e possuam conhecimento e esclarecimento das deficiências em geral e seus respectivos comprometimentos. Encontraremos alguns obstáculos junto a determinadas classes profissionais, pois alguns consideraram-se “credenciados para” e outros “aptos para”. O que conta é o desejo de cada um em se relacionar com “pessoas diferentes”. Como nomear esse trabalho?

Mesmo sendo a nomenclatura um problema semântico, pois hidro significa água e terapia significa meio, estratégia, programa especial, processo de cura ou natação, algo deverá ser aprendido pelo homem…se locomover na água.

Chamamos de Natação Adaptada o trabalho realizado em relação aos processos de aprendizagem das técnicas dos nados e Terapia, quando estamos tentando utilizar de estratégias terapêuticas para processos reabilitatórios. Tanto um como outro são recursos importantíssimos nos tratamentos em algumas especialidades médicas, tais como ortopedia, neurologia, pediatria, reumatologia, cardiologia, geriatria e até clínica médica. Temos uma experiência pessoal, com excelentes resultados em casos de pacientes convulsivos, com deficiência músculo-postural e cardiorrespiratória, deficiência mental, visual e auditiva, paralisia cerebral, autismo, entre outras patologias. Isto ocorre porque nessas atividades os pacientes experimentam todos seus mecanismos e estruturas visuais, auditivas, táteis e cinestésicas, sendo que, se alguma delas está lesada, automaticamente outra, ou outras, serão mais desenvolvidas na água, além de lhes promover saúde e prazer.

6. Resultados – Receber o “lucro” de saber que, pelo menos você, não se absteve de tentar fazer um pouco melhor a vida de um semelhante.

7. Nossas Regras:

  • Respeitar a individualidade de cada ser humano.
  • Estabelecer uma relação afetiva de ajuda e não de dependência.  
  • Utilizar a linguagem corporal como meio de comunicação.
  • Apesar de realizar um planejamento de trabalho individualizado, permitir a livre iniciativa, entendendo que a deficiência não é sinônimo de doença.
  • Respeitar a pessoa completa que e a pessoa com deficiência: um sujeito que tem uma história de vida, vive num contexto social e em condições singulares interagindo com direitos e deveres.
  • Procurar estabelecer uma relação domiciliar, isto é, tentar participar do dia a dia pessoa demonstrando o seu interesse pelo que ela é.
  • Manter contato com os demais terapeutas que assistem o paciente programando um trabalho em conjunto, produzindo assim maiores e melhores resultados.
  • Estabelecer a participação dos deficientes em grupos de conveniência e lazer, visando a sua integração na sociedade.

Referências Bibliográficas:

Velasco, CG-Habilitações e Reabilitações Psicomotoras na água- 1993. Velasco, CG-Natação Segundo a Psicomotricidade – 1994. Velasco, CG-Boas Práticas Psicomotoras Aquáticas – 2013.

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Cacilda G. Velasco

Especialista em Psicomotricidade, Titulada Especialista em Gerontopsicomotricidade pela Associação Brasileira de Psicomotricidade. Professora, Pedagoga e Profissional de Educação Física, responsável Técnica da Associação VEM SER. Vários livros publicados na área psicomotora e diferentes atuações acadêmicas com cursos, congressos, mesa redonda e atuação desde 1984 em Terapias Psicomotoras na Água.

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Cacilda G. Velasco

Especialista em Psicomotricidade, Titulada Especialista em Gerontopsicomotricidade pela Associação Brasileira de Psicomotricidade. Professora, Pedagoga e Profissional de Educação Física, responsável Técnica da Associação VEM SER. Vários livros publicados na área psicomotora e diferentes atuações acadêmicas com cursos, congressos, mesa redonda e atuação desde 1984 em Terapias Psicomotoras na Água.

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Prof. Dr. Rui Fernando Roque Martins

Professor Associado na Faculdade de Motricidade Humana (FMH) da Universidade de Lisboa (UL)
Docente na licenciatura em Reabilitação Psicomotora e Coordenador do Curso do Mestrado em Reabilitação Psicomotora, da FMH – UL
Membro fundador e delegado português do Fórum Europeu de Psicomotricidade
Delegado Português da Organização Internacional de Psicomotricidade e Relaxação desde 1989.
Honoris Causa pela Organização Internacional de Psicomotricidade e Relaxação, pela contribuição para o desenvolvimento Internacional da Psicomotricidade
Membro fundador e Presidente da Associação Portuguesa de Psicomotricidade.